quarta-feira, 15 de outubro de 2008

Estréia

Ói nóis aqui traveiz...

www.sonhosdelulu.blogspot.com

Sutilezas...

Às vezes me vem essa vontade, mais depressa do que eu possa controlar.
Uma vontade que me arrebata, que me cega
Vontade que que me tira o chão.
Quando eu sinto a alma mansa, a esperança pouca
O sorriso pequeno, o sonho escasso
Quando a criança em mim adormece e cala
Quando o tempo é longo e o dia é cinza
Quando a chuva não passa, quando o coração aperta
Quando o silêncio sufoca e a dúvida paralisa
Quando me faltam asas
Ela vem.
Com todas as cores, cheiros, sabores
Com todas as nuances, segredos, mistérios
Com força de menina e fragilidade de mulher
Com tudo de doce e de bonito
Com saudade boa e manhã de domingo
Com colo macio de vó e beijo terno de mãe
Com conversa boba de irmão
E banho de chuva, de mãos dadas com o pai, como aos cinco anos
E vem com frio na barriga e mil suspiros
Com olhos brilhantes e inquietos e sorridentes
que vêem o mundo com lentes cor-de-rosa
Com sorriso sem fim, e gargalhada de doer barriga
Com sorvete de chocolate e algodão doce azul celeste
Com risada boa de criança!
Com música que arrepia e solos de guitarra
Com pôr-do-sol em tons lilás, e céus de tirar o fôlego
Com vento fresco batendo no rosto
Com cheiro de mar e cor de sol raiando
Com mil amigos pra diversão garantida
Com alguns poucos e precisosos pra guardar pra sempre
Com filme romântico e pipoca quentinha
Com alguém que chega e me tira a fala
E que acalma e faz tudo ficar colorido
Com conversa gostosa antes de dormir
Com beijo demorado e abraço apertado e cafuné
Com sentimento nascendo e com amanhã incerto
Com gente de olhos sinceros e coração de criança
Com esperança renovada, sonho refeito, dia ensolarado
Com amor que transborda por todos os poros
Ela vem.
Ah, essa vontade...
Vontade de ir correndo pra contar pra todo mundo
(que talvez eu tenha descoberto)
que a tal felicidade mora mesmo é nesses cantinhos.

quinta-feira, 11 de outubro de 2007

Traço de personalidade n° 5: INTENSA!

Assim mesmo, em letras maiúsculas. Garrafais. Doses cavalares. Talvez esse seja o meu traço preferido, porque é o que mais agita a minha vidinha tão pacata. Tudo o que me acontece, ACONTECE. Tudo o que eu sinto, eu SINTO. O que eu falo, eu FALO. E assim por diante. Chega a ser engraçado me dar conta das minhas doses de exagero diárias, das coisas que são muuuuito coisas, sabe? Eu conheço alguém na parada de ônibus, estabeleço uma conversa, rola um entrosamento e... pronto, ferrou. Me apeguei, virei amiga, e já tô ouvindo segredo e dando conselho. E veja bem: isso não quer dizer que a relação seja superficial. Porque além de intensa, a criança aqui é profunda demais e já acha todo mundo super amigo, super essencial, super tudo. Mái Góde! Isso é assim desde que o (meu) mundo é (meu) mundo. Eu tenho um confiômetro meio desregulado, e se eu sinto confiança, eu abro. A matraca, a vida. A verdade é que eu gosto disso, eu gosto de gente, de história de gente, problema de gente, bobagem de gente. Gosto de papo, de sorriso, de toque. E eu me adapto: do assunto mais sério à filosofia de boteco (minha preferida, diga-se de passagem). De vez em quando aparece um vivente que me traz arrependimento por tanta abertura - o confiômetro é violado e eu me decepciono. Mas que saber? Prefiro essas pequenas decepções à abrir mão de me aventurar por outros mundos. Que assim seja, então!

Crises de 1/4 de idade (?!)

Todos os dias, antes de levantar da cama (com a dificuldade de sempre, fazendo drama, como sempre, e querendo mais 848377204 minutinhos de sono, como sempre), me pergunto qual das muitas "eus" vai começar o dia. Perco um tempo nisso, enquanto me espreguiço. Afinal, nunca é a mesma! Depois do 1° pé colocado (à força) pra fora da cama, já percebo. O "eu" da vez já se instalou, já tomou conta, e não há o que eu possa fazer pra trocar. Pra deixar a coisa mais emocionante, na maioria das vezes quem sai pra rua é o "eu" errado, Jézuis. Tipo assim: dia de prova. Após alguns dias de domínio da matéria pela personalidade "Estudiosa", eu acordo tranquila, pensando que tá tudo certo. É o professor entregar a prova, e pronto. Chega a personalidade DDA, a última que poderia chegar. Aí, já viu... eu me distraio com os passarinhos cantando lá fora, com a música que tocava no elevador, com o cheiro de mofo da sala, com o (irritante!) batucar da caneta do (mala) colega ao lado. Resultado? Nem queira saber, amigo. Maldita prova de... de que mesmo? Bom, whatever pra ela. Isso até é contornável, né. O pior é quando a troca do "eu" certo traz consequências irreversíveis, o que já me rendeu umas histórias divertidas, e muitas outras nem tanto. Mas isso, meu bem, eu conto depois. Porque só pra não contrariar, que acordou hoje foi a "Inspirada Pra Escrever Bobagem", mas quem deveria ter acordado é a "Foco, Há Muito o Que Fazer". Será que isso é um tipo de crise de 1/4 de idade? Oh, God. Cadê a personalidade "Freudiana Desvairada" quando eu preciso dela...

sábado, 6 de outubro de 2007

Traço de Personalidade n° 4: Cérebro Hiperativo

Conviver com os outros Traços de Personalidade pode não ser lá muito fácil. Doses extras de paciência, um tantinho de auto-consciência e mais um pouco de conformismo são essenciais pra tornar essa convivência, digamos, suportável. Com alguma prática, quem sabe até interessante. Porém, nenhum dos Traços é tão difícil quanto o 4°. A grande diferença é que esse não é controlável. Não é nem sequer contornável. Pessoas com cérebro hiperativo são eternamente escravas do próprio pensamento. Essas pobres criaturas vivem às voltas com suas massas cinzentas, tentando - em vão - controlar os turbilhões que teimam em aparecer nas horas mais inoportunas. E esse descontrole nunca é previsível. No meio da prova de estruturas, esqueço as flexo-compressões oblíquas e penso na cor do vestido que vou usar no casamento do meu primo, que acontecerá daqui a poquinho, em uns 8 meses (!). E me perco nesse pensamento... afinal, são muitas cores, infinitas possibilidades! No trabalho, esqueço o projeto no limite do prazo e me pego com água na boca, pensando naquela mousse de chocolate que comi na casa da minha vó, no Natal do ano retrasado. Numa conversa sobre os acontecimentos do fim de semana, de repente lembro daquela vez, há uns 10 anos em que fomos acampar e... meia hora depois, me dou conta de que não falei sobre o mais importante deles. Depois de uma palestra super importante, constato que não ouvi nada do que o palestrante disse, porque enquanto ele falava, eu cantava mentalmente todas as músicas daquele meu álbum preferido. Sempre assim. Tem uma hora em que eu simplesmente vôo, saio de onde deveria estar e vou pra um outro lugar. E às vezes, esqueço completamente de voltar. Em geral, esses pensamentos são assim, banais. Porém, não é só nisso que meu cérebro hiperativo tem foco. Ele também viaja em questões vitais e essenciais - só pra mim, claro. Formula teorias sobre as mais variadas coisas, e me faz perder o sono tentando achar sentido pra elas. Pensa em soluções pros mais variados problemas - dos outros, porque pros meus, parece que nem se dá conta de tentar. Projeta acontecimentos, imagina histórias, cria expectativas. Lembra das coisas mais remotas e tem saudade do que ainda não viveu. Inventa músicas, poesias, romances, e esquece de tudo antes de me dar tempo pra escrevê-los. Deseja coisas com toda a força, e muda de idéia no minuto seguinte. Se entrega à paixões arrebatadoras, que em uma semana viram piada. Tem vontades incontroláveis, e não sossega enquanto eu não me entregar à elas. Arranja uma nova certeza absoluta por dia, e pra cada nova, enterra todas as antigas. Incansável, vive procurando porquês, sempre quer respostas pra tudo. Procura, encontra, mas perde em seguida. Mergulha profundamente em auto-análises pseudo-filosóficas que, no fim, não servem pra nada. Procura critérios, e descobre que eles não existem - e que talvez seja mais divertido assim. Na verdade, pensar demais incomoda, inquieta, confunde. E ao mesmo tempo instiga, empolga, excita. Pode ser que esse cérebro exagerado me atrapalhe em certas coisas... mas ele me faz ter consciência de que isso tudo é o que eu sou. Encontrando a válvula de escape certa pra esse turbilhão, toda essa bagunça se mantém organizada o suficiente pra continuar funcionando. E me obriga a admitir: mesmo na sua loucura, ela tem lá seu charme...

quarta-feira, 3 de outubro de 2007

Traço de Personalidade n° 3: Boca-Grande

Que fique claro: o tamanho da boca, nesse caso, nada te a ver com coisas mensuráveis. Ao contrário. Impossível medir o estrago que ela pode fazer com uma simples abridinha. Em geral, as pessoas sabem quando abrir/fechar a boca. É uma questão de auto-defesa, e se aprende na infância - somos treinados a doutrinar a boca desde o "gugu-dadá". Convenção social. Aliás, mais uma das muitas. Aprendemos a não dizer verdades que magoam. A ocultar opiniões que discordam. A mascarar as impressões ruins. Além disso, aprendemos a esconder sentimentos e desejos, a fazer jogos, a dizer "não" quando tudo o que queremos dizer é um sonoro "sim". Como a natureza é sábia, a grande maioria das pessoas nasce com uma espécie de filtro entre o cérebro e a língua, o que as impede de, num rompante, falar algo que supostamente não deveria ser dito. Mas isso serve pras pessoas "normais". Em mim, deve ter acontecido algum engano. Algum acidente genético. Alguma mal-formação congênita. Demorei um pouco a entender por quê, diferente das outras pessoas, eu nunca conseguia segurar a língua. Claro! Eu simplesmente devo ter nascido sem esse filtro. Rainha dos rompantes! As coisas vêm à cabeça, e na mesma hora estão na ponta da língua. Em mim, pensamentos invariavelmente geram verbalização. Felizmente, pro bem do meu convívio em sociedade, isso não se aplica à coisas ofensivas. Pelo menos não sempre. Por exemplo: se me pedem opinião, eu tenho pleno controle das minhas faculdades mentais pra dizer um "nãããão, imagiiiiina, tá uma delíííííícia essa tortinha de banana", quando sinto náuseas só de sentir cheiro de banana. Óbvio que tal esforço de minha parte tem que ser merecido - e muito. Porém, quando falo em falta de filtro, me refiro à coisas que simplesmente poderiam não ser ditas. Ou poderiam, mas em outro momento. E isso é incontrolável quando se trata dos meus sentimentos, o que torna a coisa toda um tanto difícil. Impressionante o meu talento pra dizer hoje o que poderia esperar até amanhã. É pensar em uma coisa por mais de cinco minutos, e pronto: lá estou eu abrindo a boca. E já que o 4° traço de personalidade é pensar demais sobre tudo, o volume de coisas faladas em momentos inoportunos é enorme. Uma enxurrada. Chega a ser engraçado como eu não consigo guardar certas coisas pra mim, como as pessoas normais fazem. Os pensamentos começam a pesar, começam a me desconcentrar, e vão ficando cada vez mais desconcentrantes, de maneira que parece que vão jorrar pra fora se não forem ditos. Até que chega o momento fatídico: não consigo mais carregar o peso deles. Quero me livrar, dividi-los com alguém! Coisa triste, isso. Quando quero alguma coisa, simplesmente não há possibilidade de não dizer. Não consigo esperar pelos outros, sou do tipo que toma atitudes - talvez, por vezes precipitadas. A verdade é que pra mim, é extremamente difícil me dar conta de que as pessoas não pensam assim, e muito menos agem assim. É difícil eu me acostumar ao fato de que os "normais" falam nas entrelinhas, porque às minhas palavras não cabem interpretações! Elas sempre querem dizer exatamente o que estão dizendo. Maaaas, como o ser humano é adaptável, ainda tenho esperança de me acostumar. E - pasmem - às vezes isso me traz efeitos bem positivos. Afinal, ainda tem gente que gosta de sinceridade, mesmo que um pouco excessiva. Como nunca soube ser de outro jeito, vou tentando me adaptar à mim mesma, aos poucos. E como toda a adaptação, há os momentos de alegria e há os momentos de frustração. Se um dia inventarem transplante de filtro, talvez eu me ofereça pra ser cobaia. Senão, um dia eu me acostumo. Ou invento um manual.

Traço de Personalidade n° 2: Contraditória

Ser contraditório pode significar um monte de coisas. Nesse caso, ser contraditório não significa que seja indeciso. Não quer dizer que fique em cima do muro. Não é o mesmo que não ter personalidade. Não! Ao contrário! A contradição à qual me refiro é aquela de quem não é bitolado, de quem não se conforma fácil. Aquela de quem muda de idéia, logo: pensa. Passei muito tempo lutando contra ela até entendê-la melhor. Coitada... sempre viveu bem trancada, lá no fundão, escondida dentro de mim. E como todo o incompreendido, um dia fez-se ouvir. E gritou alto, a pobrezinha. Depois de um tempo, percebi que ela faz parte do que eu sou, e que isso pode não ser ruim. Deixei-a sair do porão e ela veio, me mostrando que as coisas não precisam ser tão certas. Não precisam ser assim, ou preto ou branco, ou gelado ou pelando, ou direita ou esquerda. Me mostrou que tudo pode ter outro lado, e que isso pode ser delicioso. E olha que beleza: descobrindo isso, minha mente inquieta pode parar de inquietar-se com as velhas coisas, sobrando mais tempo pra inquietar-se com novas coisas. Aceitando que a contradição é parte do meu todo, não preciso mais pensar se a minha personalidade é a totalmente palhaça, ou a que tem surtos filosóficos. Se é aquela “de atar em poste”, ou se é a super centrada. Se é a mulher-madura-e-bem-resolvida, ou a menininha romântica e chorona. Se é a festeira incansável (aquela louca de pés descalços no meio da pista, quando o DJ já tá tocando Frank Sinatra pra espantar a galera), ou a que troca a festa do ano por umas pipocas e um DVD de comédia romântica. A que anda em bando ou a que prefere ficar sozinha com suas caraminholas. A que tem crises (incontroláveis) de riso por qualquer bobagem, ou a que chora por propaganda de margarina. A que adora filmes franceses estranhos, ou a que já assistiu mil vezes àquela comédia mais idiota – e morreu de rir em todas elas. A que gosta de programas super culturais, ou a que não perde a novela das oito. A que adora aqueles seriados inteligentes, ou a que ficou dois dias sem dormir pra ver duas temporadas inteiras do Lost. A que viaja ouvindo Pink Floyd, ou a que adora um Fundo de Quintal. A que se arrepia com os solos das guitarras do Blues, ou a que se diverte ouvindo música brega dos anos 80. A que adora livros de filosofia e história, ou a que lê o horóscopo escondida. A que adora a poesia do Neruda, ou a que não perde uma edição da Nova. A que leva tudo a sério, ou a que não consegue falar sério por mais de cinco minutos. A que ama suas raízes, ou a que quer viver pelo mundo. A que quer viver pelo mundo, ou a que tem preguiça de sair do quarto. A que queria ser escritora, ou a que não deixa ninguém ler o que escreve. A que quer sempre manter os dois pés no chão, ou a que não tem medo de sonhar com as coisas mais impossíveis. A que sabe das coisas mais complexas, ou a que não enxerga o que é mais óbvio. A que é cheia das suas certezas concretas, ou a que não sabe se casa ou compra uma bicicleta. A que fica sem reação diante de um probleminha ridículo, ou a que tira de letra a situação mais difícil da vida. A que não vive sem um boteco cheirando a gordura, ou a que gosta de receitas sofisticadas. A que prefere as coisas mais simples da vida, ou a que sonha com um cruzeiro chiquérrimo pelas Ilhas Gregas. A super responsável e engajada, ou a que mata o trabalho só pra ver Sessão da Tarde. A que faz mil planos pra vida toda, ou a que não sabe o que vai fazer daqui a dez minutos. A que adora a praia e o mar, ou a que se irrita com toda aquela areia grudando no corpo. A que não vive sem o agito intenso da cidade, ou a que quer morar numa cabana no meio do nada. A que vê tudo pelo lado positivo, ou a que às vezes acha que tudo vai dar errado. A que é cheia de idéias e opiniões sobre todas as coisas, ou a que tem preguiça de pensar sobre qualquer uma. A que lembra dos cheiros e dos sabores de 20 anos atrás, ou a que não lembra o que almoçou ontem. A que é totalmente transparente, ou a que tem mil características que ninguém conhece. A que não se deixa levar por ilusões, ou a que se apaixona perdidamente por uma foto. A que quer ser uma super profissional, ou a que largaria tudo por amor. A que acha que se conhece profundamente, ou a que não tem a menor idéia de quem seja. No fundo, talvez eu seja isso tudo. A Dona Contradição. A que se preocupa com tudo isso, e a que acha bem mais legal ser assim.

Traço de Personalidade n° 1: Inquieta

E já que a idéia é exposição, talvez falar de mim seja o caminho natural da coisa. Não que seja daquelas pessoas que ficam eternamente bitoladas aos caminhos naturais das coisas... Pelo contrário. Sempre tive uma certa tendência a pensar que o caminho não-natural - aquele caminho pensado, chorado, brigado, teimado - fosse mais interessante. Talvez isso seja um indício de que o ser humano perdeu alguns instintos dos mais primitivos. Nesse caso, o instinto da acomodação à situação que lhe é confortável. Confortável = Conhecido. Conhecido = Previsível. E se esse indício for verdade, bendita evolução das espécies! Não fosse a curiosidade de buscar outro caminho, a tristeza do comodismo seria o destino certo. Uma das minhas milhões de perguntas-que-não-querem-calar é se seria mais confortável ser alguém acomodado. Alguém que não questiona a si próprio e aos outros. Alguém que não duvida das coisas que os olhos vêem. Alguém que não acredita no que os olhos não podem ver. Às vezes tenho a impressão de que os acomodados são pessoas mais felizes. Afinal, não precisam conviver com tantos pontos de interrogação. Os acomodados não se perguntam se escolheram a profissão certa. Simplesmente cumprem sua função, dia após dia. Os acomodados não se perguntam se escolheram a pessoa certa. Simplesmente convivem com ela, dia após dia. Não se perguntam se estão no lugar certo. Simplesmente vivem ali, dia após dia. A compensação é que eles vivem em paz. Talvez uma falsa paz, mas em paz. Ao contrário deles, os inquietos questionam tudo, o tempo todo. Se a rotina do trabalho cansa, lá vão eles à procura de um novo, mesmo que isso signifique correr o risco de ficar sem nenhum. Se a pessoa que escolheram não é mais como era, lá vão eles à procura de outra que lhes satisfaça, mesmo que isso signifique correr o risco de ficar sozinho. Se o lugar onde vivem não lhes dá a sensação de lar, lá vão eles buscar seu lugar no mundo, mesmo que isso signifique jamais parar de procurar. A compensação é que eles enxergam as coisas mais nitidamente. Vivenciam, experimentam, sentem, aprendem. Caem e levantam, perdem e ganham, choram e riem, amam e odeiam, erram e acertam. Definitivamente, os inquietos são meu tipo preferido de gente. Não que seja fácil conviver com a inquietação... mas sempre que me pego pensando se não seria melhor ser acomodada, ela vem pra me mostrar um ângulo diferente. E vem com força, mexendo com meus neurônios, tirando tudo do lugar. E mesmo que ela bagunce com as coisas que eu demorei pra arrumar, agradeço por ter tirado a poeira acumulada de cima de mim.

terça-feira, 2 de outubro de 2007

Ah, os começos...

Fazendo o cadastro pra começar o blog, me pego pensando: "PRA QUÊ, Deus do Céu?" Pergunta retórica, certamente. Igualzinha àquelas tantas que me faço a cada minuto. Engraçado, isso... Vinte e tantos anos, e ainda não acostumei. Bom... que seja. Não obtendo resposta, prossegui com as devidas burocracias - até pra isso!! - até ler a mensagem: "pronto! agora você já pode postar seus textos e dividir com seus amigos". Imediatamente, a pergunta retórica do momento passa a ser: "PRA QUEM, Senhor?" A partir daí, dois pés no freio. Afinal, nem consigo lembrar quando foi o exato momento em que me dei por conta de que a minha cabeça era um balaio de palavras. Desses balaios grandes, que a gente vê nas lojas em troca de estação, cheio de coisas que as pessoas compram pra nunca usar, ou de coisas que sobraram em algum canto escurinho do estoque. Só sei que, vendo o balaio cheinho de todo o tipo de badulaque, a solução pra evitar o risco iminente de transbordamento era tentar organizá-los, colocando cada um no seu lugar certinho, bem etiquetado. Pra isso, usei caderno, bloco, livro, guardanapo, parede de quarto. Fui do giz-de-cera ao cotoco de lápis. Do cotoco de lápis à caneta Bic. Da caneta Bic à caneta Bic de 4 cores, logo promovidas à 10 cores, logo promovidas à 12 cores com cheirinho (!). Fui da letra desenhada com habilidade motora duvidosa, aos quadradinhos mágicos do teclado. E assim por diante. Tudo o que me engasgava, escrevia. Tudo o que eu desejava, escrevia. Tudo o que me enfurecia, escrevia. Sempre escrevi sobre tudo, e sobre o nada. E sobre mim, e sobre os outros. E sobre o que eu pensava, e sobre o que eu pensava do que eu pensava. E sobre o que acontecia, e sobre o que que queria que acontecesse. Montes e montes de palavras, que na maioria das vezes só poderiam mesmo fazer sentido pra mim. Isso, quando faziam algum sentido. Mesmo quando não faziam, criava por elas um carinho como aquele que a gente cria por quem nos dá um colo. Porque sempre foi isso que elas fizeram por mim - o conforto e o aconchego de um colo. E justamente por isso nunca as dividi com ninguém. Alguém ler qualquer coisa que eu tenha escrito seria como ler um diário, mesmo que, de fora, parecesse mais um balaio cheio, onde nunca se acha o que se procura. Mesmo que as coisas não estivessem escritas claramente. Por isso, o espanto comigo mesma. Escrever num blog seria o mesmo que tirar a roupa em público. E cá entre nós, mesmo o maior dos narcisistas não se sentiria à vontade em tal situação. Então, percebi que a tal frase estava redondamente equivocada. O cadastro deveria vir acompanhado de um sonoro "pronto! agora você já pode ficar nua em rede mundial." Ou um "pronto! agora todo mundo vai saber dos seus maiores segredos." Porque no fundo, é assim que eu vou me sentir. Pra evitar isso, já bolei uma estratégia - mais uma das habilidades do meu cérebro hiperativo. Não dar o endereço do blog pra ninguém! Genial. Assim, não corro o risco de um conhecido me pegar com as calças na mão. E nesse caso, literalmente.